Ela conheceu um rapaz incrível ontem. Ele é amigo do namorado da amiga de uma amiga dela. Não importa, ela gostou dele. E ele gostou dela. Gostou do seu batom vermelho, do seu sorriso encantador e do cheiro que sentiu quando ela chegou perto dele para dizer ‘olá’. A malícia nos olhos dele deixou claro que ele sabia o que o olá dela significava: ela queria fumar um cigarro, na janela do apartamento dele, enquanto ele adormecia exaustivamente satisfeito, com gemidos ainda a ecoar no quarto desarrumado.
E ela – cujos olhos têm malícia também – soube ler no sorriso dele que ele queria mesmo arrancar o seu sutiã no final da noite. Sem ter que lhe pedir o e-mail, nem conhecer a sua mãe, nem saber qual é o seu prato preferido ou sequer convidá-la para jantar.
No fundo, no fundo – e do alto da sua safadeza genuína – pouco lhe interessa se ele vai ligar no dia seguinte; não lhe interessa se ele ronca, porque ela vai sair de fininho assim que estiver satisfeita. Vai fechar a porta devagar e apanhar o primeiro táxi. Sem deixar nem um bilhete no frigorífico – porque, para ela, foi o suficiente. O agora valeu a pena e não precisa haver depois.
E quando ela está quase absolutamente convencida do seu direito – pensando bem, não é um direito, é uma vontade mesmo – de querer só sexo casual, a sua amiga politicamente correta e entediante até à alma, diz alto ao seu ouvido: “Esquece, ele só te quer comer!”
“Ele só te quer comer.” Como se ela tivesse saído para a noite, com a sua mini-saia recém comprada e umas boas doses de tequila para procurar um casamento. Ou para procurar um rapaz que tivesse um bom emprego e uma mãe menos chata que as sogras que ela já teve. Ou que bebesse pouco e quisesse ter filhos, que não roncasse e também quisesse uma lua de mel em Veneza – porque qual é a mulher que não quer uma lua de mel em Veneza? – ah, pois, ela não quer por enquanto. Ela só se quer divertir – e qual é o problema nisso?
Então, juntamente com essa tão sonhada e, pouco a pouco, conquistada liberdade feminina, deveria vir um manual de instruções sobre como se livrar da hipocrisia dos outros. Para que toda a gente compreenda que não há nenhum desvio de carácter numa pessoa que só quer sexo casual. E isso quer dizer que não há nada de errado no facto de ele só querer comê-la, desde que isso fique claro para ela – é como um ‘li e aceito os termos de uso’ – ninguém engana ninguém e os interesses coincidem.
Então ela aprendeu que não há nada de errado em querer só um envolvimento casual. E não há nada de errado nela por só querer sexo casual – isso não significa que ela não seja digna de alguém que lhe dê mais do que sexo. Pode significar – e significa, muitas vezes – que ela naquele momento simplesmente não quer alguém que lhe dê mais do que sexo. E então, depois de atirar toda a hipocrisia para o lixo, ela encheu o peito para responder à sua amiga politicamente correta: Ele só me quer comer?! – óptimo. Eu só o quero comer também.
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